Curtas tem a difícil missão de transformar, em poucos minutos, a visão do expectador.
Você joga uma ideia na imagem e ela te sugere uma determinada situação a qual, propositalmente, te obriga a criar um conceito estreito à respeito da trama. Em The Wait (2018), uma mulher grávida e um velho esperam pelo ônibus no ponto. O senhor de idade tenta se aproximar dela perguntando-lhe sobre a gravidez e a mulher, por sua vez, parece aflita. São os ingredientes iniciais que se apoiam nos arquétipos: a mulher, prestes a embarcar na jornada da maternidade, e o ancião, homem sábio que tenta lhe mostrar uma visão mais tranquila da vida.
Os arquétipos são os pilares de diversas narrativas. No tarô, por exemplo, os arcanos maiores (as principais cartas do baralho), aparecem como figuras que trazem lições morais. Quando uma lição moral entra no seu jogo, é hora de se voltar a essa perspectiva e tentar aprender com o seu significado. A sabedoria dos ancestrais é representada em diversas cartas e todas elas nos trazem o momento de se modificar com a experiência que, antes de se tornar nossa, vem de outras fontes. São sempre esses dois movimentos que duelam entre si: o que está dentro, o que está fora. Nem todos os conflitos são inerentes à nossa pessoa, nem todos são obstruções interferindo no nosso caminho.
No caso da grávida e do velho, podemos ver dois sentidos: a mulher que personifica o movimento, alguém que está a ponto de ir de encontro a transformações, a um novo ciclo de vida; do outro lado, o ancião que carrega toda uma existência e tem uma postura passiva.
Uma das coisas que mais se destaca num roteirista é o uso do subtexto, que é a alternativa na qual o guionista pode brincar com as sensações do espectador e colocar em jogo uma série de recursos que podem ser descobertos a partir de pistas deixadas na obra e, no caso deste curta, os olhares. Há uma deixa no olhar da mulher que nos leva a entender o seu arco. Da mesma maneira, o velho tem um movimento contrário, saindo de um olhar sutil para um aflito e, ao final, mudando o próprio valor inicial que ele carrega. Pelos olhares vemos os próprios personagens mudarem o seu papel dentro da mini-trama. A mulher que se transforma na sabedoria e o velho que passa a viver o enfrentamento de sua própria jornada. O ônibus chega.
O curta é escrito e dirigido por Jason McColgan e estrelado por Poppy Roe e Mike Burnside. O idioma é o inglês e, infelizmente, o curta não possui legendas.
The Wait from Jason McColgan on Vimeo.