A quebra de expectativas funciona muito bem para construir uma história, contanto que não a destrua.
Outlander estreou em 2014 com o pacote completo: uma boa premissa, um roteiro dinâmico, uma locação de tirar o fôlego e ótima química entre o seu par romântico. Apesar de ser voltada para a narração de um grande amor, a série, baseada nos livros homônimos escritos por Diana Gabaldon, também tem espaço para um grande pedaço de história e drama, o que mostra um pé na realidade.
A capacidade de se renovar era um aspecto crucial do roteiro em Outlander. Durante o decorrer da primeira temporada, cada episódio nos apresentava a um local diferente, ou, no mínimo, a personagens que mudavam completamente o decorrer da história. Não apenas essas mudanças físicas e narrativas aconteciam, como também podíamos ver a nossa personagem principal quase em agonia enquanto lutava com a sua nova realidade.
Claire (Caitriona Balfe) vai passar do desejo urgente de fuga ao desejo de permanecer em outro tempo, mesmo com todas as suas ressalvas ao ambiente machista em que se encontra, tudo devido ao enlace arrebatador da sua vida com a de Jaime (Sam Heughan). A história funciona bem e os dois atores têm uma química tal que são capazes de segurar um episódio inteiro em nada mais que isso, como foi feito no episódio sete, The Wedding.
Com os acontecimentos do final da temporada, entretanto, toda essa dinâmica irá mudar. Isso porque não será mais possível passar com a mesma rapidez pelos elementos da trama; alguns deles vão pairar sobre a narrativa e custar a serem resolvidos, se é que se pode dizer que serão.
Apesar de manter essa ponta aberta, a série vai buscar uma completa renovação na construção e no andamento dos episódios. A segunda temporada começa em Paris e, enquanto lida com os pormenores políticos de uma sequência mais ampla e familiar, não parece estar andando para onde deveria ou lidando com o que poderia lidar. A pompa e o estilo estão apenas atrasando os confrontos que irão decidir o rumo da história, bem como da estória.
Os valores histórico e narrativo se desconectam a partir de então, porque o envolvimento das personagens com o todo deixa de ser orgânico e passa a ser um instrumento para manter a narrativa andando e impedi-la de cair no marasmo e na depressão próprios de tragédias pessoais tão amplas.
Nesse meio confuso, a persona de Heughan continua a crescer exponencialmente frente ao espectador, mas todo o encanto da primeira temporada cai num realismo mais duro. As aquisições de Paris à história não são nem de longe tão marcantes quanto aquelas que acompanham o casal na própria Escócia, com a exceção de Fergus (Romann Berrux), que consegue encontrar um espaço mais permanente.
A sucessão de desafios pessoais culmina na quebra de expectativa final: a separação do nosso casal principal. A correria para chegar à emocionante cena de adeus não deixa o espectador convencido da necessidade para tal, apesar da trama seguir uma linha de raciocínio coerente nesse sentido.
Assim, a terceira temporada terá um propósito, de reuni-los. Pode-se dizer qualquer coisa de Outlander, mas não que seu roteiro não seja detalhista; podemos ver isso quando cinco episódios são necessários para atingir tal meta, perpassando os acontecimentos de suas vidas separados. Como Jamie sobreviveu? Como foi a vida de Claire com Frank (Tobias Menzies)? Jack Randall (mesmo ator de Frank) finalmente morreu? Brianna simplesmente aceitou que sua mãe partisse? Eles se apaixonaram outra vez? E muitas outras perguntas que nunca nos faríamos entraram nesse ínterim.
Quando eles finalmente se unem, a dinâmica entre os dois tem a estranheza que deve, mas algumas coisas familiares até demais entram em cena junto disso. Claire sendo atacada; Jamie com um mandato de prisão. Lembra? Aconteceu em todas as anteriores, pelo menos, uma dúzia de vezes.
A narrativa continua se arrastando de elo em elo para gerar algum drama e proporcionar alguma inovação. Dessa vez temos novos territórios, com alguns episódios na América. Mas o que estamos fazendo? Seguindo uma personagem que mal conhecemos, objetivo que pode até ser esquecido em alguns momentos. “Ah, é, o menino ainda está em perigo, não é mesmo?”.
O andamento, em resumo, é penoso. Da mesma maneira que a primeira temporada te prendeu na cadeira, a terceira vai te impelir para fora dela, pelo menos até as sequências finais. Os últimos episódios são uma grande redenção, pois temos elementos novos e intrigantes, junto a personagens conhecidas, mas que não imaginávamos que veríamos outra vez, e o casal nos deixando sem ar com uma gama de olhares intensos e montagens sensuais.
O espaço onde a série nunca erra é entre os dois. As cenas do casal e seu envolvimento são fruto de uma conexão genuína entre Caitriona Balfe e Sam Heughan, o que continua a levar o espectador para o lugar onde ele se apaixonou pela série. A terceira temporada, no que se refere aos dois, tem sequências inesquecíveis.
A necessidade constante de Outlander em desvendar novos caminhos nem sempre deu certo, ainda que, sem dúvidas, mostre sua capacidade de passar por cima do marasmo e de se recuperar de sequências que não tiveram êxito. Ao chegar final dos episódios lançados atualmente, é possível ter uma sensação de retorno às emoções que cativam os fãs da série. Só novembro dirá.
Abaixo, você pode conferir o teaser da quarta temporada, divulgado pela Starz.
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