Simples e objetivo, O Último Suspiro traz reflexões sobre empatia e sobrevivência na atual sociedade francesa.
Temas apocalípticos têm sido frequentes nos últimos anos, em diversos gêneros e movimentos do cinema ao redor do mundo. Algo parecido aconteceu na Europa do século passado, durante as Revoluções Industriais. Nessa época, a popularização do sci-fi e distopias tornou-se quase comum, e é isto que encontramos não muito tempo depois.
A princípio, O Último Suspiro não apresenta nada de novo. A presença de uma doença como a Imunodeficiência Combinada Grave parece arbitrária, devido ao repertório de filmes que a utilizam forçosamente. A fumaça desconhecida certamente iria tornar-se conhecida, originada de ataques terroristas ou, em última hipótese, consequência de um desastre natural já esperado ou conhecido pela população parisiense. Correto? Errado.
Por incrível que pareça, Daniel Roby (diretor) traz uma nova perspectiva a um tema já tantas vezes explorado. Neste filme, a doença já mencionada é parte essencial para o desenvolvimento da trama, tornando-se, inclusive, o ponto de maior reflexão simbólica no que diz respeito às relações humanas diante de limitações biológicas.
Romain Duris vive a história de um pai carinhoso e protetor, que faz de tudo para curar sua filha condenada (Erja Malatier), desde a infância, a uma vida dentro de uma bolha. Seu desespero é mais do que evidente em suas expressões faciais no decorrer da proliferação da névoa desconhecida, e sua transformação decadente é colocada de maneira gradual, discreta, e mesmo o espectador mais atento dificilmente perceberá a mudança antes do fim do filme.
A principal razão para que o espectador não perceba as transformações não apenas físicas, mas também psicoemocionais entre os protagonistas, é por estar extremamente envolvido em cada fase do enredo, sem desgrudar-se dos caminhos percorridos pelas personagens por nem mesmo um segundo. A direção de fotografia aqui tem papel importantíssimo em captar a atenção do público. A escolha dos planos, dos movimentos de câmera, dos cortes, tudo isso evitou que O Último Suspiro caísse em monotonia, por ter-se originado de uma história com poucos pontos de conflito.
O departamento de som também foi essencial, ao trazer à tona pequenos sons diante de uma catástrofe tão grande. Dificilmente notamos o trabalho do sonoplasta em filmes do cotidiano, mas neste, em especial, não há como não notar. Tudo em O Último Suspiro é minimalista, próximo demais, chegando ao ponto, talvez, de trazer a tragédia para o espectador através da história dessa família, que é mais empática do que qualquer outra, por sua simplicidade em dividir oxigênio, pelo espírito de equipe, por pensar no coletivo e por não deixar ninguém para trás – nem mesmo o casal de idosos acolhedores, que lhe deram abrigo até quando foi possível.
Cada passo, cada ato, cada respiração ou suspiro é visto e ouvido dentro desta atmosfera quase documental. Eles não deixam passar nada despercebido. Para o desenvolvimento da trama, é extremamente importante mostrar todos os momentos vividos pelas personagens, pois, assim, torna-se mais fácil entender as tentativas e erros em cumprir o Super Objetivo¹ dos protagonistas, diante de tantos obstáculos aparentemente imbatíveis.
Mas, se for para desvendar a grande metáfora do filme, decerto encontraremos uma crítica à sociedade francesa, à falta de empatia diante de problemas alheios, mas, principalmente, uma reflexão especial aos portadores de Imunodeficiência. O Último Suspiro nos traz o seguinte questionamento: e se fosse o contrário? E se nós, a população em maioria, vivêssemos num mundo em que o próprio ar nos causasse morte?
Para ter acesso à lista de filmes e mais informações sobre o Festival Varilux de Cinema Francês, vocês podem consultar o site oficial deles. Abaixo, segue trailer do filme: